quarta-feira, 13 de maio de 2009

Vizinho encrenqueiro

Um cidadão de Utah - USA - chamado Mark Easton, reclamou na prefeitura local que a casa que o seu vizinho havia construído diante da dele era 50 cm mais alta do que o regulamento permitia e que, por isso, obstruia a visão das belas montanhas da região.

A prefeitura então ordenou ao vizinho que corrigisse a construção, 50 cm mais baixa.

Meses depois a prefeitura recebeu novamente uma outra queixa de Mark Easton reclamando que, ao reconstruir, o vizinho havia colocado novas janelas que ele realmente não apreciava.

O funcionário da prefeitura resolveu ir ao local para averiguar, e fizeram as fotos que você vê aí abaixo…






sexta-feira, 17 de abril de 2009

Congresso gastou R$ 84 milhões com passagens em 2008

Em meio à polêmica envolvendo passagens aéreas no Congresso Nacional, levantamento realizado pelo Contas Abertas mostra que a Câmara e o Senado gastaram R$ 84 milhões em 2008 com pagamento de bilhetes emitidos para viagens dentro do país e para o exterior. A Câmara, que têm 513 parlamentares e cerca de 18 mil funcionários (entre servidores do quadro, comissionados, secretários parlamentares e terceirizados), gastou mais – R$ 65 milhões. O Senado, que têm 81 senadores e cerca de 6,2 mil servidores e comissionados (excluindo os terceirizados), pagou R$ 19 milhões. Em 2009, as duas Casas já desembolsaram R$ 18,9 milhões com pagamento de passagens (veja tabela).

O pagamento de passagens aéreas para o exterior consumiu R$ 3,5 milhões do Congresso Nacional em 2008, sendo R$ 2,9 milhões do Senado e R$ 684,4 mil da Câmara. Este ano, o Senado já pagou R$ 1,2 milhão em bilhetes internacionais e a Câmara R$ 167,3 mil. O Senado ainda desembolsou recursos na rubrica “locação de meios de transporte”, o equivalente a R$ 6,1 milhões em 2008 e R$ 164,9 mil este ano.

Cada deputado tem direito a uma cota mensal de passagens aéreas que varia entre cerca de R$ 4,7 mil e R$ 18,7 mil, de acordo com o estado de origem do deputado. A quantia mínima é para parlamentares residentes em Brasília e a máxima para os de Roraima. Hoje o presidente da Câmara, deputado Michel Temer, anunciou que a cota mensal de passagens aéreas para os parlamentares será reduzida em 20%. Segundo a Mesa Diretora da Casa, a medida culminará em uma economia de R$ 15,6 milhões por ano.

Já os senadores têm direito a uma cota mensal de cinco viagens de ida e volta a seus estados, montante que varia entre cerca de R$ 4 mil e R$ 16 mil. Também hoje, a Comissão Diretora do Senado decidiu reduzir em 25% a cota destinada as despesas com bilhetes aéreos, que deverá passar de R$ 1,3 milhão para R$ 975 mil por mês. Além das medidas de redução nas cotas mensais, as duas Casas anunciaram que o uso das passagens áereas será restrito aos parlamentares, conjugês, dependentes legais e assessores no exercício da atividade parlamentar.

Em uma rápida consulta em um site de uma companhia aérea, é possível observar que uma passagem entre Brasília e São Paulo, ida e volta, custa em torno de R$ 638,00 em tarifa “programada”, ou seja, compra antecipada. Com o valor médio mensal da cota de um deputado, por exemplo (R$ 11,7 mil), daria para comprar 18 bilhetes, ida e volta, aeroporto Juscelino Kubitschek-Guarulhos. Para o especialista em finanças públicas José Matias Pereira, professor da Universidade de Brasília (UnB), há uma cultura no Parlamento brasileiro de que os parlamentares podem tudo e que todos os pedidos feitos por deputados e senadores têm de ser atendidos. “Isso é um sintoma de uma instituição que se sente diferenciada, e que se espalha pelas demais assembléias legislativas de todo o país. Os membros do Congresso pensam que não têm que prestar contas à sociedade”, critica.

O especialista acredita que os dirigentes no Congresso devem rever o formato de pagamento dessas despesas. “A sociedade atual, do século XXI, exige transparência e princípios morais e éticos. E não adianta falar que é difícil fazer um controle sobre os gastos com passagens, pois diante das tecnologias que temos, seria muito fácil fiscalizar isso”, afirma, e conclui: “por que não utilizam a consultoria da Fundação Getúlio Vargas, recém contratada pelo Senado, ampliam para a Câmara também, e revêem esses gastos? Esse mau exemplo do uso de dinheiro público favorece o espírito de impunidade”.

Leandro Kleber
Do Contas Abertas

quinta-feira, 16 de abril de 2009

A dupla face das decisões do STF


Quando estão em pauta os limites da atuação do Supremo Tribunal Federal, tendemos a concentrar nossa atenção no resultado imediato das suas decisões. Quem ganhou? Quem perdeu? Considere, por exemplo, a recente decisão em caráter liminar do STF afirmando ser constitucional o entendimento do presidente da Câmara, deputado Michel Temer, de que medidas provisórias pendentes de apreciação pelo Congresso só trancam a pauta para deliberação de leis ordinárias, não afetando outros tipos de normas. Segundo o ministro Celso de Mello, a tese de Temer “parece demonstrar reverência ao texto constitucional”. O que isso significa para a relação entre os poderes da República? Se pensarmos apenas no resultado imediato, é natural enxergar simples vitória da Presidência da Câmara. Esse olhar, porém, é incompleto. Os julgamentos do STF têm dupla face.

O lado mais aparente é a solução da questão específica levada ao tribunal. Mas há mais. Em cada decisão, de forma mais ou menos explícita, o Supremo manifesta também o seu entendimento de qual deve ser a extensão de seus poderes em relação ao Executivo e ao Legislativo. Tribunais não apenas decidem conflitos, mas oferecem à sociedade razões para a tomada dessas decisões — o que os juristas chamam de “motivação” ou “fundamentação”. Na construção da motivação, tribunais hábeis podem expandir o seu poder no longo prazo, mesmo quando decidem favoravelmente ao Executivo ou ao Legislativo aqui e agora — e redesenhar a estrutura da separação de poderes, mesmo em casos de pouco impacto. Em 2004, por exemplo, em ação extinta sem julgamento do mérito, o ministro Celso de Mello aproveitou a oportunidade para afirmar que o STF poderia anular um veto do presidente a projeto de lei de diretrizes orçamentárias elaborado pelo Congresso, caso entendesse ser o veto incompatível com “políticas públicas já previstas na Constituição”. De lá para cá, essa decisão já foi citada várias vezes em votos e discursos dos ministros do STF. Se, em um futuro próximo, o tribunal declarar inconstitucional um veto do presidente nessas condições, estará apenas trilhando caminho já anunciado.

Não se trata de estratégia nova, nem restrita ao Brasil. Remonta à primeira decisão em que um tribunal expressamente afirmou o seu poder de declarar inconstitucionais leis democraticamente aprovadas: o caso Marbury vs. Madison, da Suprema Corte dos EUA (1803). O presidente da Corte, John Marshall, agradou ao presidente dos EUA, Thomas Jefferson, ao negar que a Suprema Corte tivesse competência para ordenar que o governo empossasse o juiz Marbury, nomeado no apagar das luzes do mandato do presidente anterior. Mas, na mesma decisão, defendeu que cabia ao Judiciário declarar inconstitucionais leis regularmente adotadas pelo Congresso Nacional — concepção inovadora para a época e que não estava explícita na Constituição dos EUA. Satisfeito com a preservação de sua autoridade naquele caso especifico, Jefferson demorou anos para questionar essa afirmação de poder judicial. A decisão de efeitos imediatos quase insignificantes — a posse de um juiz — moldou o sistema político dos EUA e se tornou uma das mais influentes na história do constitucionalismo mundial.

A todo momento, no menor dos casos, um tribunal pode estar em pleno — e público — processo de remarcação das fronteiras do seu poder. Muitas vezes, Congresso e o presidente tendem a não colocar em questão a fundamentação que lhes garantiu a vitória no curto prazo. Parecem esquecer que toda decisão judicial olha simultaneamente para o caso presente e para o futuro. Ficam, então, surpresos quando o já anunciado poder do Supremo (e que bem os serviu no passado) é usado de forma contrária aos seus interesses atuais.

Parece ser o caso na recente vitória da Presidência da Câmara. Por trás da boa notícia (“você venceu”), a segunda face: a tese prevalece apenas porque o Supremo a considera meritória (“você venceu porque eu concordo”). O STF poderia, talvez, ter afirmado alguma margem de apreciação que o presidente da Câmara tem na interpretação do texto constitucional (“você venceu porque está na sua esfera de competência adotar essa dentre outras interpretações possíveis”). Mas não foi o caso: a decisão confirmada enfatizou ser do Supremo a palavra final sobre interpretações constitucionais feitas por parlamentares quanto às regras do processo legislativo. Não cabe aqui discutir se deve ou não ser assim. Mas é certo que, com a decisão que hoje agrada à mesa da Câmara, há uma afirmação do poder do Supremo. Nesse cenário, contabilizar resultados é insuficiente para entender a expansão do poder judicial.

Diego Werneck Arguelhes - Doutorando em direito pela Universidade Yale (EUA) e professor da Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas (FGV-RJ)
Publicado no Correio Braziliense de 16 de janeiro de 2009

segunda-feira, 13 de abril de 2009

É rir pra não chorar - tentativa de bitoca termina em processo judicial

É difícil de acreditar. Mas uma tentativa de bitoca dentro de uma van de transporte alternativo em Brasília vira processo judicial e mobiliza mais de 43 profissionais altamente especializados por quase 3 anos para punir este perigosíssimo contraventor, o beijoqueiro tosco.

Azar dele que a mina não queria papo, tampouco queria beijo, e dum cabra feio que só a ...Não só ele não conseguiu a bitoca, como ganhou uma bela surra da pobre vítima.

Na sentença, o juiz suplica pela coerência e razoabilidade na propositura de ações judiciais e, como tava de bom humor no dia em que decidiu esta ação, deu uma bela sacaneada nos promotores que insistem em ajuizar demandas dessa natureza.

Circunscrição: 1 - BRASILIA

Processo: 2007.01.1.039400-2

Vara: 601 - PRIMEIRA VARA DE ENTORP. E CONTRAV. PENAIS

AÇÃO PENAL PÚBLICA PROCESSO N.º: 39400-2/07

AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO

SENTENÇA

Esse é o relato do insólito episódio de RODRIGO RAMOS DE LIMA acusado de tentar dar uma bicotinha no rosto da suposta vítima e, desse modo, "atentar contra o pudor" da distinta.

Conta a pitoresca acusação que no longínquo 20 de fevereiro de 2006, no interior de um veículo do transporte alternativo a moçoila foi surpreendida pelo inopinado beijoqueiro que, de supetão, não tendo resistido aos encantos da donzela, direcionou-lhe a beiçola, tendo como objetivo certo a face alva da passageira que se encontrava a seu lado.

A "vítima", por sinal uma moçona forte, essa teria reagido e rechaçado a inesperada demonstração de intimidade não existente. Posteriormente, quando ao ser inquirida em Juízo, terminaria por afirmar que deu um tapa no rosto do sujeito e depois o esmurrou por diversas vezes. Além disso, completaria, quando estava na delegacia teria cravado as unhas no pescoço do rapaz e sacudido para impedir-lhe a fuga.

Enquanto a suposta vítima, uma mulher forte e robusta, relatava para os presentes à audiência o ocorrido e gesticulava, mostrando como havia esgoelado o beijocador, todos os presentes à sala acompanharam entre estupefatos e incrédulos o minucioso relato ilustrado com um toque de sadismo. Ouvindo tais pormenores todos se puseram a pensar em quem teria sido a verdadeira vítima no episódio.

Uma testemunha visual do ocorrido completaria o excêntrico relato das proezas de brio e fecunda valentia da moça que não quis o beijo: "- D... reagiu e 'deu muita porrada no sujeito'".

Ao final dos depoimentos este magistrado não resistiu e, informalmente, perguntou para a "vítima" se o sujeito era bonito: " - Dr. se ele fosse um Reinaldo Gianecchini a reação teria sido outra...", ouvi.

Durante a tramitação do processo, percebendo o quão esdrúxula era a peça acusatória, um representante ministerial chegou a postular pela aplicação ao caso do princípio da insignificância (fls. 58/60). A magistrada que me precedeu, contudo, discordou e remeteu os autos ao Procurador de Justiça que, por sua vez, designou uma comissão composta de três "expertos". Após rebuscada pesquisa, calcada em substanciosos argumentos sobre o que representava o beijo tentado do engenhoso personagem, a tríade lançou o circunstanciado veredicto: "- não é possível o arquivamento com base no princípio da insignificância", "- a aplicação de medida de segurança poderá trazer auxílio à família..."

Assim, em atendimento à manifestação ministerial referida, o feito teve prosseguimento.

Até que em alegações finais o promotor de justiça derradeiramente encarregado do caso pugnasse pela absolvição do acusado.

Claro que é quase impossível aferir com exatidão as dezenas de profissionais chamados a intervir no presente processo durante a tramitação processual: policiais civis e militares e outros servidores públicos ligados à Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal, ao Ministério Público Distrito Federal e ao Tribunal de Justiça do Distrito Federal, tais como analistas e técnicos judiciários, escrivães, oficiais de justiça, diretores e substitutos de cartórios, oficiais de gabinete, executantes, motoristas, seguranças, secretários, garçons, zeladores e faxineiros, eletricistas, digitadores e técnicos em informática, vigilantes e tantos outros que poderiam ampliar imensamente essa lista.

Alguns, talvez os principais desses atores processuais, contudo, ao praticarem atos processuais, deixaram suas assinaturas nos autos do processo, tornando mais fácil a quantificação e enumeração desses sujeitos.

Passo a enumerá-los:

· 10 (dez) juízes de direito: fls. 2, 13, 40, 49, 62, 78, 122, 127 e 121, exemplificativamente, além de fl. 35 dos autos em apenso;

· 8 (oito) promotores de justiça: fls. 2, 24, 28, 41v, 60, 64, 82 e 113v, exemplificativamente;

· 5 (cinco) procuradores de justiça: fls. 66, 76 e 80;

· 9 (nove) defensores: fls. 20, 39, 48, 96, 99, 130 e 150, exemplificativamente, e ainda fl. 14 dos autos em apenso;

· 8 (oito) médicos: fl. 18 e também fls. 24, 27, 28, 30 e 31, dos autos em apenso;

· 3 (três) delegados de polícia: fls. 6, 45 e 124.

Esses sujeitos processuais anteriormente discriminados perfazem o total de 43 profissionais altamente especializados que ao longo da tramitação do processo, ou seja, de 20/02/2006 até a presente data (interregno de quase três anos, ou, mais precisamente, dois anos, oito meses e treze dias) receberam dos cofres públicos (considerando-se os respectivos décimos terceiros salários) proventos que podem ser estimados pela média em R$ 39.674.666,67 (trinta e nove milhões, seiscentos e setenta e quatro mil, seiscentos e sessenta e seis centavos).

Evidente que tais agentes públicos atuaram concomitantemente em diversos outros casos. No entanto, tal estimativa serve para evidenciar o tamanho do disparate em direcionar essa estrutura leviatânica para apurar a prática de uma bicota, aliás, uma tentativa de bicota, levada a efeito pelo infeliz acusado.

Evidentemente, estamos desconsiderando outros custos, como aqueles relacionados a gastos de papel, cartuchos para impressão, cartolina, cordonê e outros materiais e suprimentos de escritório, energia elétrica, comunicação telefônica e via correios, combustível, maquinário diverso et cetera.

Por certo, não foi mensurado o inevitável custo do impacto ambiental gerado desde antes da instauração do inquérito até a instauração e encerramento da relação jurídica processual. Ou seja, estimamos apenas uma parte do custo social envolvido com a tramitação do processo do aspirante a beijoqueiro.

Toda essa movimentação magnânima teria sido feita em nome da suposta e pomposa "importunação ofensiva ao pudor"…

Ao final, seria de se perguntar: vale a pena? É esse o mister do Direito Processual Penal do século XXI? Ou deveria esse ramo do direito se voltar a apurar aquelas condutas que atinjam bens jurídicos que realmente mereçam a tutela penal?

Outras perguntas não querem calar: como não ver insignificância, sob a ótica penal, na conduta praticada pelo acusado? O que fazer com o princípio da proporcionalidade, que recomenda correspondência entre as sanções penais e a gravidade das condutas praticadas pelos infratores penais? Como ignorar, por outro lado, que o acusado foi solenemente espancado pela "vítima" após o triste episódio do beijo frustrado e continuou a sê-lo até a chegada à delegacia de polícia? É evidente que o promotor de justiça que oficiou pelo reconhecimento da insignificância agiu imbuído de bom senso e soube distinguir o fútil e o irrelevante daquilo que é sério, grave e de relevo.

Sensibilidade e discernimento também demonstrou o outro representante do Ministério Público que, em alegações finais, postulou pela absolvição do acusado.

Tais posturas ajudam a depurar e orientar a persecução penal, reservando-a a casos realmente relevantes. Felicitem-se aqueles promotores que voltam o principal de suas atenções e energias para punir autores de crimes de lesa-pátria, que causam prejuízos milionários ao erário, como fraude de licitações públicas, corrupção e sonegação.

Encômios àqueles que questionam, por exemplo, a atitude do Chefe do Executivo local e procuram demonstrar a violação da Constituição e das leis penais praticadas por tal agente ao criar casuisticamente Secretaria de Estado, sem amparo na Lei Orgânica do Distrito Federal, para proteger acusados da prática de graves crimes cometidos contra a Administração Pública.

Elogios àqueles que estão preocupados com a apuração dos crimes cometidos com violência e grave ameaça às vítimas, furtos e estelionatos vultosos, estupros, homicídios e outros similares. Não que outros casos não possam ser objetos de reflexão. Contudo, a cada situação o tratamento jurídico correspondente deve ser o mais adequado. O Direito Penal e Processual Penal, é óbvio, reserva-se à tutela daqueles bens jurídicos da vida mais relevantes. A hipótese dos autos não está a merecer, ao menos em desfavor do acusado, a atenção da seara penal.

Qualquer controvérsia poderia ser solucionada por meio de outros mecanismos e instrumentos de apaziguamento social.

Aos que sugeriram a aplicação de medida de segurança ao acusado faço lembrar o imorredouro caso de GILDÁSIO MARQUES DE SOUZA, que ao ser absolvido da prática de lesões corporais simples, por sentença datada de 24/10/67, recebeu medida de segurança e terminou por ficar encarcerado em presídios e em manicômios por mais de 36 anos, destituído de dignidade, cidadania e de relações sociais. Dois anos antes de Gildásio ser colocado em liberdade, um laudo foi juntado aos autos da execução da medida de segurança confirmando a "cessação da periculosidade" de Gildásio. Mesmo assim, Gildásio permaneceu enclausurado no Presídio Feminino de Brasília, Capital da República, até que os autos chegaram ao signatário da presente sentença que, indignado com a ignomínia e tomado por opróbrio com tanto descaso e humilhação, cumpriu o dever de extinguir aquela reprimenda vergonhosa de duração ilimitada. Foram trinta e seis anos de esquecimento, angústia, desprezo e perversidade contra o autor de um delito que, à luz da legislação vigente na atualidade, não poderia sequer ser recolhido à prisão...

Percebe-se, assim, o cuidado que se deve ter em aplicar aos acusados da prática de infrações penais a malfadada medida de segurança. Alguém poderia dizer que ao invés de internação poderia ser aplicada ao acusado a medida de segurança na forma de tratamento ambulatorial. Isso não mudaria em nada a impertinência da proposta. Medida de segurança é sempre medida de segurança: tanto a internação pode, circunstancialmente, se converter em tratamento ambulatorial, quanto esta pode se transformar na primeira. E o mais grave é que não há prazo legal para o término da pena infamante. Não consigo enxergar em quê "- a aplicação de medida de segurança poderá trazer auxílio à família..."

Tecidas tais considerações, nada mais resta senão reconhecer o que deveria ter sido admitido ab initio, RODRIGO RAMOS DE LIMA não praticou crime e por isso o tenho por absolvido. Por fim, faço votos de que não surja um "iluminado" com a "estupenda" idéia de, através de recurso, prorrogar a presente discussão e sangria de recursos públicos financeiros e humanos. Gastos inúteis não se justificam em parte alguma.

Sem custas.

Remeta-se cópia da presente sentença ao Procurador-Geral de Justiça do Distrito Federal para ciência.

Publique-se no Diário da Justiça. Registre-se. Intimem-se.

Após o trânsito em julgado procedam-se as anotações e comunicações de estilo.

Brasília-DF, 03 de novembro de 2008.

Fábio Martins de Lima Juiz de Direito Substituto

(Fonte: Site do TJDFT)

quinta-feira, 9 de abril de 2009

Grandes rizicultores e Embrapa se opõem à liberação do grão elaborado pela Bayer

Após a soja, o milho e o algodão, agora é a vez do arroz correr o risco de ter sua versão transgênica liberada para o comércio. Mas, a julgar pelos resultados de audiência pública realizada no dia 18 de março pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), dessa vez, a aprovação irá encontrar muito mais obstáculos. Até entidades do agronegócio se colocam contra a liberação, assim como a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), geralmente favorável aos transgênicos.
A Federação das Associações de Arrozeiros do Rio Grande do Sul (Federarroz), Estado responsável por 62% da produção nacional, declarou-se contra a liberação, assim como a Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul). “Foi algo inédito, essas entidades estavam lá praticamente com a mesma posição dos movimentos da Via Campesina”, pontua Leonardo Melgarejo, agrônomo e representante do Ministério do Desenvolvimento Agrário na CTNBio.
Rafael Cruz, cientista social e coordenador da campanha de engenharia genética do Greenpeace, também se declarou surpreso com a nova posição dessas entidades. “No passado, a Farsul defendeu a soja transgênica, assim como a Embrapa. Claro que os argumentos que trazem não são novos, mas esse posicionamento abertamente contrário, ainda que por questões mais econômicas, é algo novo”, avalia.
Prejuízos
Cultivos transgênicos encontram dificuldades de comercialização em diversos mercados, mas, no caso do arroz, a rejeição é quase total. Somente nos Estados Unidos a comercialização foi liberada; porém, após um caso grave de contaminação em 2006, os agricultores estadunidenses têm ignorado a semente da Bayer. Segundo Cruz, muitos países já estão procurando se defender de uma eventual investida da empresa alemã. A Tailândia, por exemplo, um dos principais produtores mundiais do grão, colocou regras muito duras para a aprovação e, nas Filipinas, um pedido de liberação foi embargado judicialmente.
Além das complicações para exportar, agricultores têm sentido no bolso o que movimentos sociais e as entidades ambientalistas alertavam desde o início: a produção transgênica é menos custosa apenas a curto prazo. No Brasil, por exemplo, os produtores de soja geneticamente modificada já começaram a ter prejuízos. Isso porque as ervas daninhas criaram resistência ao herbicida da Monsanto, vendido de forma casada com a semente. Assim, além dos royalties que são pagos a cada safra, o uso de agrotóxicos não diminuiu e em alguns casos até aumentou, ou seja, os custos de produção subiram.
De acordo com Melgarejo, um representante da Bayer declarou, durante a audiência, que o herbicida de sua empresa teria uma vida útil de dez anos. Isto é, após esse período, já não seria mais eficiente.
Saúde
Para além de questões econômicas, os organismos geneticamente modificados (OGMs) são rejeitados por entidades ambientalistas e de direitos do consumidor, além de movimentos sociais, por conta dos efeitos que podem causar na saúde humana e no meio ambiente e também por serem parte de um projeto de dominação das transnacionais sobre os recursos naturais e a agricultura.
No caso do arroz, o herbicida utilizado, o glufosinato de amônio, é considerado altamente nocivo. O parlamento europeu o qualifica como cancerígeno, mutagênico e tóxico e não permite seu uso. Testes feitos em ratos mostraram que a ingestão da substância gerou alterações no sistema nervoso, reações alérgicas e convulsões.
Andrea Salazar, do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), que esteve presente na audiência, acredita que as informações ali apresentadas pela empresa são falhas e insuficientes. A advogada e consultora aponta que isso, entretanto, não é uma surpresa quando se leva em conta os casos da soja, milho e algodão. “Fica evidente a deficiência e a precariedade das informações apresentadas pelas empresas quando entram com pedido de liberação; há um espectro de avaliação de risco muito limitado, tanto no aspecto da saúde como de meio ambiente”, pontua.
Ela critica a atuação da CTNBio, que, na sua opinião, mantém um método de análise “precário e irresponsável, o qual põe a população – no caso do arroz ainda mais – em risco”. Leonardo Melgarejo explica que, infelizmente, muitos conselheiros afirmam que analisam a questão apenas do ponto de vista da biossegurança, e não político ou comercial. “A ciência não é neutra e nossas escolhas têm implicações políticas e econômicas”, contesta. (Leia mais na edição 317 do Brasil de Fato).
Dafne Melo - da Redação Boletim Brasil de Fato

Congresso brasileiro pesa muito no bolso da população. Eles valem tudo isso?

De acordo com um levantamento feito pela Transparência Brasil sobre os Orçamentos do Legislativo federal em 11 outros países(Alemanha, Argentina, Canadá, Chile, Espanha, Estados Unidos, França, Grã-Bretanha, Itália, México e Portugal), só o Congresso norte-americano é mais caro que o brasileiro, mas ainda assim pesa menos no bolso de cada cidadão do país.

Desconsiderando a produção legislativa dos nossos ilustres congressistas, ou melhor, do nosso Poder Executivo (que gosta mesmo é de socar Medida Provisória no C... Nacional), nossos excelentíssimos parlamentares evidênciam uma grave falha: a aversão ao trabalho.

O estudo da Transparência Brasil Como são nossos parlamentares revela que, em 2007, os 499 deputados federais que integram alguma comissão daquela casa faltaram, em média, a 28% das sessões. Como bem destaca o estudo, são nas comissões temáticas que os projetos legislativos são analisados e discutidos.

Dentre os parlamentares que têm grande dificuldade de exercer seus mandatos, alguns se destacam: Jader Barbalho(PMDB-PA), integrante da Comissão de Ciência e Tecnologia, não compareceu a nenhuma das reuniões em 2007; Fernando Diniz (PMDB-MG), Henrique Alves (PMDB-RN), Onyx Lorenzoni (DEM-RS) e Rodrigo Maia (DEM-RJ), cada um deles faltou a mais de 90% das reuniões das comissões a que pertencem.

Talvez devessemos pegar parte dos 20 milhões gastos com indenizações a título de ressarcimento de viagens realizadas por estes nobres trabalhadores e mandá-los pra .......


Com tanto dinheiro gasto em viagens seria suficiente para cada um dos 513 deputados percorrer de avião quase 190 mil quilômetros, ou cerca de 5 voltas em torno da Terra - cuja circunferência é de cerca de 40.000 quilômetros.

sexta-feira, 3 de abril de 2009

JUÍZES BONS DE BOLA

Em recente inspeção realizada no Poder judiciário do Maranhão, a Corregedoria Nacional de Justiça apurou indícios de uma avalanche de irregularidades, a serem corrigidas por 39 medidas propostas pelo corregedor Ministro Gilson Dipp, do Superior Tribunal de Justiça.

Entre os muitos problemas detectados, chama a atenção a recomendação inserta no item 19.1 do relatório do CNJ, que sugere aos juízes maranhenses evitar o “agendamento de torneios esportivos no horário de expediente forense.”

Aqui, um resumo do relatório do CNJ.

A propósito, bem que o TJ/AM poderia evitar que as solenidades de posse de desembargador sejam agendada no horário do expediente forense. Causa imenso prejuízo às partes que têm audiências designadas justamente para o dia do evento.

Golpe, contragolpe ou revolução?

Quarenta e cinco anos depois, falta esclarecer quase tudo: foi um contragolpe, golpe de Estado, golpe militar, revolução? A própria data é discutível: o presidente legítimo, João Goulart, deixou a capital no dia 1º de abril, mas aqueles que o derrubaram não queriam que o episódio parecesse uma piada e anteciparam a comemoração para o dia 31 de março.

Mas existem algumas certezas: em 1964 foi instalada uma ditadura e esta ditadura desdobrou-se em várias fases que se estenderam ao longo de 21 anos.

Se a ditadura foi branda comparada com as outras dos países vizinhos, não importa. Foi uma inequívoca quebra da ordem constitucional em que foram anulados os direitos políticos e humanos.

Os argentinos, mais dramáticos do que nós, denominam a década de 30 do século vinte como "década infame". Em nosso caso, as duas décadas dolorosas e humilhantes entre 64 e 85 são classificadas eufemisticamente como "anos de chumbo".

Parece que os brasileiros não gostam da sua história: os 200 anos da imprensa que deveriam ser comemorados no ano passado foram engavetados porque ainda há gente que não quer reconhecer que a inquisição operou no Brasil ao longo de quase três séculos.

A ditadura militar teve o aval da imprensa e quando a imprensa percebeu a enrascada em que se meteu já era tarde. Não foi a primeira vez: o golpe que implantou o Estado Novo em 1937 também foi recebido sem oposição, tal como as violentas medidas de exceção depois da Intentona Comunista de 1935.

A revisão da história não se faz por decreto. A sociedade é quem deve convocá-la. Uma coisa é certa, enquanto não conhecermos os detalhes do nosso passado, estaremos sempre sujeitos a repeti-lo.
Alberto Dines # editorial do programa Observatório da Imprensa na TV nº 496, no ar em 31/03/2009
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OI NA TV: 1964 Os efeitos do golpe na imprensa brasileira
Por Lilia Diniz em 1/4/2009

No dia em que o golpe militar de 1964 completou 45 anos, o Observatório da Imprensa exibido pela TVBrasil na terça-feira (31/03) discutiu os reflexos do período de exceção para a imprensa brasileira. A censura aos meios de comunicação e o cerceamento das liberdades individuais marcaram a ditadura militar instalada na madrugada daquela terça-feira, 31 de março de 64. O golpe deflagrado contra o presidente legalmente constituído João Goulart tinha como objetivo restaurar a disciplina nas Forças Armadas e conter o suposto avanço comunista que ameaçaria a ordem e a segurança do país.

O historiador Marco Antonio Villa participou do debate pelo estúdio em São Paulo. Professor do Departamento de Ciências Sociais e do programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR), em São Paulo, Villa é autor de Jango, um perfil (1945-1964). Em Brasília, o convidado foi Ronaldo Costa Couto. Doutor em História pela Universidade de Paris-Sorbonne (Paris IV), Costa Couto é também economista, jornalista, pesquisador e professor universitário. Acompanhou a transição para a democracia e ocupou diversos cargos no primeiro governo após a ditadura militar.

No Rio de Janeiro participou Daniel Aarão Reis Filho, doutor em História Social pela Universidade de São Paulo (USP) e professor titular de História Contemporânea do Departamento de História da Universidade Federal Fluminense (UFF), que atualmente pesquisa a História das Esquerdas no Brasil. Em 1964, fazia parte da diretoria do centro estudantil do colégio onde estudava e já iniciava sua participação na política.

A Mídia na Semana

Alberto Dines comentou as notícias de destaque nos últimos dias na coluna "A Mídia na Semana". O primeiro assunto da seção foi a publicação de um mesmo artigo - tradução de um texto do colunista Nicholas D. Kristof, do New York Times - pelos jornais O Estado de S.Paulo (23/03) e Folha de S.Paulo (29/03). Para Dines, o inusitado fato parece piada. "O engraçado é que o texto foi muito comentado no site do Observatório da Imprensa e tratava das vantagens da mídia impressa sobre a digital. Parece que aqueles que fazem jornal não lêem jornal", observou.
Motivado pela proximidade do dia da mentira, 1° de abril, o jornalista relembrou a edição da revista Veja de 27/04/1983, em que saiu a matéria "Fruto da Carne". Veja inspirou-se em um artigo da revista britânica New Science de semanas antes que, em uma brincadeira de primeiro de abril, inventou um texto sobre a fusão de células animais e vegetais. A editoria de Ciência da revista brasileira não entendeu a piada e publicou a matéria sobre a produção do "boimate", que misturava células de boi com de tomate. Dines comentou que a revista "levou a sério" e ouviu especialistas brasileiros sobre o assunto, mas só desculpou-se com os leitores meses depois, em 06 de julho de 83.

A proximidade do julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) da Lei de Imprensa e da exigência do diploma para jornalistas foi o último assunto da coluna. "Entram em pauta dois assuntos da maior relevância e ambos relacionados com a liberdade de expressão. Nossa Suprema Corte vai discutir o fim da Lei de Imprensa e também a regulamentação da profissão de jornalista com a obrigatoriedade do diploma. Os dois estatutos foram produzidos pelo regime militar e ambos com defensores nos mais respeitáveis ambientes", disse.

"Ditabranda" vs. ditadura

A Folha de S.Paulo, em editorial publicado no dia 17 de fevereiro deste ano, reacendeu a discussão sobre a ditadura no Brasil ao usar a expressão "ditabranda" para caracterizar o regime militar que vigorou por cerca de vinte anos no país. Os leitores do jornal reagiram imediatamente, enviando cartas e até promovendo uma manifestação em frente à sede do jornal. A comunidade acadêmica também discutiu a polêmica. Os professores Fábio Konder Comparato e Maria Victoria Benevides criticaram o editorial em artigos publicados pelo diário paulista.
A Folha respondeu à polêmica em uma "Nota da Redação" que explicava que a expressão fora utilizada porque "na comparação com outros regimes instalados na região no período, a ditadura brasileira apresentou níveis baixos de violência política e institucional". Para o jornalista Wilson Figueiredo, que foi entrevistado pelo Observatório, o uso do termo não foi "uma coisa séria", mas sim "um jogo de palavras". Segundo ele, a ditadura é "inaceitável" porque ao censurar a imprensa, cercear as liberdades individuais e inibir a atividade política, traz conseqüências imprevisíveis para a sociedade.

O programa também entrevistou o jornalista Marco Antônio Tavares Coelho, que em 1964 era deputado federal. O jornalista relembrou que estava na Câmara dos Deputados na noite de 31 de março, quando foi chamado ao Palácio do Planalto por Darcy Ribeiro, então Chefe do Gabinete Civil. Ao chegar lá, ouviu o político e antropólogo descrever um "quadro terrível" ao narrar os primeiro movimentos do golpe que já estava em curso. Marco Antônio Tavares Coelho disse que Darcy Ribeiro considerava imprescindível uma reação por parte daqueles que resistiam ao golpe: as lideranças sindicais e os comunistas sediados em Brasília. Estes deveriam receber armas do Chefe da Polícia Federal e prender deputados e até ministros do STF. O jornalista recusou-se a participar porque não concordava com "nenhuma ação terrorista" e queria lutar dentro da legalidade. O ex-deputado acredita que o plano de Darcy Ribeiro foi uma ação de desespero para impedir a tomada de poder.

A participação da sociedade civil no golpe

No debate ao vivo, Dines perguntou a Marco Antonio Villa se a tomada de poder foi um golpe ou um contragolpe. O historiador explicou que a conjuntura política entre 1961 e 1964 era complexa, com tendência ao radicalismo e marcada por uma concepção de política de "assalto ao poder". Naquela época, não havia diálogo. Pensava-se: "você não convive com opositores, você tem inimigos e inimigos você os elimina", disse Villa. Foi um período de intensas lutas políticas no Brasil e o historiador destacou momentos como a Campanha da Legalidade, a adoção do Parlamentarismo e, posteriormente, a do Presidencialismo.

A Revolução Cubana de 1959 estava presente e havia uma forte tendência nas elites políticas brasileiras de desprezar a democracia. Este viés estava claro nos setores conservadores que liderariam o golpe, mas também estava presente na esquerda, que desde 1961 trabalhava com uma "perspectiva de golpe". Villa destacou que o golpe foi "civil-militar" e lembrou que quando o ex-presidente João Goulart deixou o poder e rumou para Porto Alegre, a presidência foi declarada vaga pelo presidente da Câmara. Duas semanas depois, o Congresso Nacional elegeu o então general e futuro marechal Castelo Branco. Uma particularidade brasileira.

A disposição intervencionista das Forças Armadas brasileiras é marcada desde o Movimento Tenentista de 1922, segundo Ronaldo Costa Couto. O escritor comentou que a tendência atravessou todo o período e manifestou-se de forma contundente na deposição do ex-presidente Getúlio Vargas, em 1945. Reapareceu após a morte do político, em 1954 e também após a eleição de Juscelino Kubitschek, em 1955. A política "salvacionista" das Forças Armadas "vem de longe" e tornou-se mais forte com a eclosão da Guerra Fria com a disputa ideológica entre socialistas e capitalistas e a polarização entre Estados Unidos e URSS. "Eu acredito que 1964 é o ano de 1954 adiado", disse o escritor.

Diferentes matizes dentro da esquerda

"As esquerdas, como as direitas, são sempre plurais", avaliou Daniel Aarão. No conturbado período entre 1961 e 1964 havia dentro das esquerdas brasileiras tendências comprometidas com projetos revolucionários que queriam transformar o país "de uma sociedade capitalista em uma sociedade comunista". Havia diferentes nuances dentro dos grupos de esquerda, mas este era o espírito. Agrupações políticas estavam "desencantadas" com a possibilidade de realizar as reformas por meio pacífico.

Havia a esquerda "mais radical", mas também grupos mais moderados, como a "esquerda positiva", conforme classificou Santiago Dantas, ministro da Fazenda de João Goulart. Para Marco Antonio Villa, a democracia foi a grande derrotada do período. "Poderíamos ter buscado uma grande aliança que incorporasse o centro e setores da direita em uma aposta democrática que aprovasse as reformas buscando uma ampla articulação no Congresso Nacional", avaliou.
O historiador concorda que o golpe foi civil-militar. "Não foi uma quartelada típica da América Latina", explicou, foi um golpe que afetou as instituições, mas apoiado por movimentos sociais de grandes proporções, como as marchas da Família com Deus pela Liberdade. Para refletir sobre a ditadura, disse Villa, é preciso observar a participação dos movimentos socais mais conservadores. A gênese do período de exceção obteve apoio "bastante considerável" da sociedade brasileira, mas com o tempo perdeu o prestígio inicial.

Ronaldo Costa Couto concordou que o movimento militar teve um importante apoio civil. Parte da imprensa, "tecnocratas" e a classe média estavam de acordo com a tomada de poder. O escritor relembrou uma entrevista que fez com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva na década de 1980, na qual o então líder sindical comentou que à época dos fatos "recebeu o movimento como uma coisa boa para o Brasil".

Dois pesos, duas medidas?

Um telespectador perguntou aos participantes se a mídia brasileira "é mais condescendente com ditaduras de esquerda do que com regimes de direita". Ronaldo Costa Couto considera que "há de tudo" na imprensa. A partir da promulgação do AI-5, em dezembro de 1968, até a retomada da liberdade de imprensa, em janeiro de 1975, com a suspensão da censura prévia imposta ao jornal O Estado de S.Paulo, a posição da imprensa foi diversificada – da "imprensa nanica", que atuou com coragem e formou opinião, à grande mídia, que inicialmente apoiou o regime militar. "A história da imprensa no período é de heroísmo e de enfrentamento, mas também de adesão", explicou.

Marco Antonio Villa destacou que o único jornal que não apoiou o golpe foi a Última Hora, de Samuel Wainer. Jornais que no final da década de 1960 teriam um importante papel de denúncia e luta para o restabelecimento da democracia, como o Correio da Manhã, Jornal do Brasil, Folha de S.Paulo e O Estado de S.Paulo apoiaram a queda do presidente João Goulart. Para o historiador, é preciso lembrar que o Estado Novo (1937-1945) também reprimiu a atividade da imprensa de forma severa, mas que o governo "foi muito hábil" na cooptação de intelectuais por intermédio do ministro da Educação, Gustavo Capanema. Daniel Aarão ponderou que a ditadura militar teve uma postura similar de adesão de intelectuais e articulou com meios de comunicação, como a TV Globo.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

SILÊNCIO OBSEQUIOSO: Omissão da mídia sobre o acordo com o Vaticano

É grave e clamoroso o silêncio da imprensa em relação à assinatura do acordo entre o Executivo brasileiro e a Santa Sé. Como é grave a atitude de, ao dar a matéria, meramente divulgar informações oficiais do governo brasileiro ou do Vaticano, que obviamente tentam minimizar a ameaça à laicidade do Estado, que está presente. Não fosse por outro motivo, seria de se esperar atenção da imprensa, pelo vigor renovado das reações de tantos setores, a cada nova ameaça ao Estado laico.


É bom lembrar que há exatos dois anos tornou-se público que a Santa Sé pressionava o presidente Lula para assinar um acordo bilateral (tratado ou concordata), ameaçando o princípio da laicidade, o que ocasionou reações fortes e justificadas de amplos setores. Em continuidade a movimento que remonta aos primórdios da República, são pessoas de muitas e diversas origens que têm se dedicado a demonstrar e reafirmar como o princípio da laicidade do Estado é indissolúvel da democracia, como consagrado na Constituição brasileira.


Mera reprodução


Ora, a opinião pública merece respeito e à imprensa cabe cumprir seu papel de informar, em particular quando o gesto que é político – como reconhecido, em busca de seu próprio benefício, pela Santa Sé – ameaça a liberdade de consciência e de crença dos pertencentes a outros grupos ideológicos e religiosos. O silêncio da imprensa há de ser tomado como presumidamente auto-imposto, já que não se pode imaginar que tipo de pressão as partes contratantes do acordo poderiam fazer, estando, como estamos, em uma democracia.


Vale mencionar, primeiramente, que o porta-voz da Presidência da República, Marcelo Baumbach, fez anúncio da viagem do presidente a Roma, "a caminho de Washington". Era 6 de novembro, uma semana antes da data agendada para a assinatura, ou seja, com tempo apertado, porém suficiente, para explorar o anunciado (ver aqui a transcrição da íntegra da coletiva).


Assim, seria de se esperar o debate pela imprensa, em particular por toda a polêmica em ocasiões anteriores em que o tema veio à tona, fosse diretamente, ou por riscos a que se viu exposto o Estado laico, como no caso da pesquisa com células-tronco.


Mas houve até veículos que simplesmente suprimiram o anúncio da assinatura do acordo, mencionando apenas que, "durante o encontro, Lula e Bento 16 podem discutir temas como combate à fome, direitos humanos e solidariedade entre os povos". Outros, como o UOL, ofereceram, sem destaque, o anúncio completo: "Na reunião reservada com o papa, Lula deve assinar um tratado com o Vaticano sobre a atuação da Igreja Católica no Brasil" (ver aqui); recortaram em particular a fala do porta-voz da Presidência: "O importante é que o acordo preserve o preceito constitucional de liberdade religiosa. Não será discutido credo, mas os direitos e deveres da entidade religiosa." Ponto final, sem críticas, "outros lados", ou quaisquer análises, mera reprodução da Agência Brasil.


Falha imperdoável


Pode-se até entender a posição do porta-voz de, no anúncio, tentar neutralizar a polêmica, buscando garantir que estariam assegurados os direitos de todos, o que ganhava relevância em face de ser a primeira vez que clara e oficialmente era assumida pelo governo a existência de negociações antigas, como dado no UOL: "Segundo Baumbach, o Brasil e o Vaticano negociam há alguns anos a redação de um documento sobre a relação entre os dois países".


É sabido que diferentes ministérios do governo federal foram chamados a se manifestar sobre a proposta do Vaticano em diferentes rodadas ao longo desses anos; ou seja, não foi gesto isolado do presidente, que bem poderia ter tido e ouvido algum de seus colaboradores a aconselhar a abertura do debate, que só teria a ganhar vindo à luz, protegendo a autoridade republicana da pressão indevida. Mas não foi assim, não sendo possível compreender como a imprensa não rastreou o processo. Sabe-se ainda que são fortes as pressões da Santa Sé reivindicando sigilo nas negociações, como chegou a ser anunciado em 2007, quando da visita do papa ao Brasil.


Por isso, não surpreende que o presidente Lula tenha sido "convidado" a assinar esse documento longe dos olhos do Brasil. Já com o presidente de Portugal havia sido usado esse artifício em 2004, para assinar, no Vaticano, em sigilo, uma concordata, lá noticiada apenas a posteriori. Essa estratégia é da Igreja Católica que, como qualquer instituição humana, procura fazer valer seus interesses; aceitá-la, é problema do governo, atitude questionável, mas do mundo da política; calar e não investigar é falha imperdoável da imprensa.


Sem ouvir nem informar


Ou seja, paradoxalmente, mesmo sob pressão, quem até tentou avisar foi o presidente – de forma limitada, no último momento, mas avisou. Por isso é impossível compreender por que a imprensa se furtou ao debate, quando houvera o anúncio por parte do Palácio do Planalto daquela agenda, ainda que de última hora. Seria o tempo para informar a opinião pública, oferecer debates, dados técnicos sobre o que são acordos bilaterais, peculiaridades da Santa Sé como Estado, a diferença entre a questão política e as questões de crença, o que poderia significar frente à ordem constitucional brasileira, em que afetaria ou não afetaria a vida da cidadania em geral etc.


Haveria a oferecer ao público o aporte do amplo arco de grupos que se mobiliza em favor da laicidade do Estado. Deixaram de ouvir fontes respeitáveis, que têm importantes e diversas contribuições a oferecer: minorias religiosas, em sua imensa diversidade no Brasil, monoteístas e politeístas, ateus e agnósticos; defensores e defensoras dos direitos sexuais e reprodutivos; movimento de mulheres e dos setores GBLTT; grupos acadêmicos dedicados ao estudo do Estado laico; associações científicas; e defensores da liberdade de expressão, para citar apenas alguns segmentos.


A representatividade e força desses setores é sua profunda heterogeneidade, sem qualquer centralização ou hierarquia, indicadora das múltiplas e diversas manifestações da pluralidade humana, base da democracia, como tanto indicaram cientistas políticos e filósofos como Arendt e Bobbio e outros. A imprensa nem se serviu dessas fontes para analisar e, antes ainda, nem informou, deixando igualmente de servir a todos e de cumprir sua missão.


Carta-manifesto


Já na ocasião da visita do papa Bento 16 ao Brasil, em 2007, a cobertura da imprensa deixara a desejar, como analisamos neste Observatório (ver "A imprensa em falta com o Brasil"). Naquela oportunidade, a maior parte da imprensa adotou atitude que extrapolava o respeito e a atenção – naturalmente devidas - à significativa e respeitável população católica no Brasil, para adotar cobertura que ignorou a pluralidade religiosa e o caráter laico do Estado brasileiro. Ali, a imprensa foi positivamente surpreendida pelo gesto do presidente Lula, que naquele momento teve coragem para cumprir seu juramento de defesa da Constituição brasileira e reafirmou a laicidade diretamente ao papa Bento 16, dizendo que não assinaria qualquer acordo bilateral, por ser o Brasil um Estado laico. Alberto Dines destacou no OI a contradição entre uma imprensa recolhida e o presidente assertivo (ver "Catequese da mídia contraria Estado laico").


Não fosse por outro motivo, desta vez seria de se esperar que a imprensa perguntasse ao presidente Lula: o que mudou, em 18 meses, que tornou possível assinar o acordo? Não seria de se esperar que a imprensa pedisse acesso ao documento, antes da assinatura, para submeter a análises e confirmar, ou não, as assertivas de que não haveria riscos à separação entre Estado e religiões? Ou, no caso, riscos à separação entre o Estado e especificamente a Igreja Católica Romana, que vigora desde o início da República, por ser matéria de interesse de todos?


Ao invés disso, o silêncio auto-obsequioso foi quase total: a CBN abriu espaço para o debate antes da assinatura do acordo (com base em notícias de jornais de outros países), como alguns veículos independentes, blogueiros isolados ou de instituições. A ONG "Católicas pelo Direito de Decidir" lançou uma carta-manifesto repercutida por diversas ONGs ligadas ao movimento de mulheres, e que não recebeu atenção da mídia para uma posição relevante que demonstra que entre os próprios católicos não há, felizmente, expectativa unânime de que o Estado brasileiro abdique da laicidade para se submeter a um grupo religioso.


Retrocesso, uma ameaça


Mais constrangedor ainda foi brasileiros e brasileiras precisarem consultar jornais estrangeiros, na internet, como o argentino Clarín, entre outros, que a partir do dia 9 de novembro detalharam aspectos do acordo, ouvindo fontes em geral não identificadas, trouxeram informações relativas a coletivas de que participou o presidente Lula em Roma, com o presidente italiano, em que o tema do acordo com o Vaticano foi abordado, deixando a impressão de que os veículos brasileiros sequer tinham correspondentes em Roma.


Como reagir à situação de o mundo discutir uma interpretação da vida brasileira que não teríamos jamais em vista, pelo absurdo, como a idéia de que o acordo protegeria a Igreja Católica até de mudanças na lei brasileira? Ou mesmo informações da presença de itens que, de fato, "caíram" na versão final do acordo? Ou com interpretação distinta dos termos depois anunciados, como prenúncio de próximas pressões?


Resta esperar que, já assinado o acordo, a imprensa cumpra seu dever, ainda que tardiamente, impulsionando o debate porque há ainda o que fazer. Basta ler o artigo 20, que implicitamente traz a exigência constitucional, no lado brasileiro, de que seja ratificado pelo Congresso Nacional. Que a omissão não permaneça como a marca histórica da imprensa neste momento tão crítico em que a República, em seu 119º aniversário, é ameaçada de retrocesso em séculos.



Leia também


Entrevista da autora a Heródoto Barbeiro (rádio CBN)


Acordo por debaixo dos panos-Alberto Dines


A íntegra do acordo (Ministério das Relações Exteriores)



(Por Roseli Fischmann em 18/11/2008 ) do Observatorio da Imprensa

quarta-feira, 1 de abril de 2009

Candidatos mentem à Justiça Eleitoral

Análise é realizada sobre dados referentes a todos os parlamentares em exercício em fevereiro de 2009 na Câmara dos Deputados, Senado, Assembléias Legislativas e Câmaras de Vereadores das Capitais, num total de 2.368 integrantes.

Sessenta e cinco por cento desses parlamentares (1.531) fizeram doações eleitorais. Desses, 782 foram candidatos, o que significa que tiveram de informar o seu patrimônio à Justiça Eleitoral. Isso permite comparar os bens que declararam com as doações que fizeram.

O resultado é que nada menos de 85 deles (11% dos 782) fizeram doações que superaram o total dos bens que declararam possuir.

Os que doaram a campanhas mais de metade de seu patrimônio declarado (incluindo portanto os anteriores) são 114 (15% dos 782).

Determinando-se as médias de generosidade eleitoral por estados, a lista é encabeçada pelo Maranhão, onde os parlamentares doaram em média 80,2% de seu patrimônio declarado. Seguem-se Rondônia (38,6%) e Pernambuco (31,7%).

Pelo menos no caso dos candidatos que doaram mais recursos do que declararam possuir, é certo que mentiram – ou têm patrimônio maior do que declararam ou o dinheiro que disseram ter doado não era realmente deles.

Veja o quadro completo em www.excelencias.org.br/@dpat08.php, incluindo, para cada parlamentar, os candidatos para os quais eles doaram recursos.
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A legislação brasileira requer de todos os candidatos a eleições que forneçam à Justiça Eleitoral dois tipos de informações de natureza financeira: declarações de bens e todas as doações que recebem para suas campanhas.2 Desde as eleições de 2002 o TSE torna públicas as doações eleitorais. A Transparência Brasil solicita esses dados, submete-os a tratamento e os publica em seu projeto Às Claras (www.asclaras.org.br).

Quanto às declarações patrimoniais, elas passaram a ser publicadas pelo TSE a partir das eleições de 2006. Antes disso, para conhecê-las era necessário recolhê-las fisicamente em cada circunscrição eleitoral.

Em ambos os casos, as declarações servem para propiciar o controle do comportamento dos políticos por parte dos eleitores.

Com essa finalidade, a Transparência Brasil publica tanto as doações eleitorais quanto as declarações de bens em seu projeto Excelências (www.excelencias.org.br), um cadastro de todos os parlamentares em exercício no Senado Federal, Câmara dos Deputados, Assembléias Legislativas estaduais, Câmara Legislativa do Distrito Federal e Câmaras Municipais de capitais, com informações de vários tipos sobre cada político.

O princípio que justifica a publicação de declarações de bens de candidatos é permitir que se realize o monitoramento da evolução patrimonial dos políticos. Essa finalidade é, infelizmente, largamente frustrada no Brasil por dois motivos: o primeiro é que não se exige que a declaração patrimonial seja a mesma entregue à Receita Federal. Com isso, os candidatos podem fazer declarações completamente diferentes à Justiça Eleitoral e à Receita. Tal possibilidade se transforma em quase certeza porque não existe, na legislação, nenhuma penalidade (seja eleitoral, seja fiscal) para indivíduos que prestem declarações falsas à Justiça Eleitoral.

Como mentir não gera problemas, há incentivos para que candidatos mintam – e pelo menos 11% deles são certamente mentirosos, como demonstrado neste relatório.
No que diz respeito às doações eleitorais, outro grave defeito da legislação eleitoral do país é não exigir que a publicação dos doadores seja feita durante as campanhas – o que permitiria ao eleitor aquilatar os interesses em jogo no apoio de cada candidato. Por isso, só se conhece o perfil de doações recebidas pelos candidatos após cada eleição.

Ainda assim, a informação é muito útil. A publicação dos dados de financiamento eleitoral permite que o eleitor compare o desempenho legislativo ou executivo dos candidatos eleitos com seus padrões de financiamento. Será que uma empresa que financiou substancialmente um prefeito está vencendo licitações públicas naquele município com freqüência maior do que seria esperado pelas condições do mercado? É para isso que os dados de financiamento são apresentados nas fichas dos políticos no projeto Excelências.

Os relatórios de receitas eleitorais dos candidatos mostram que muitos deles fazem doações, a maioria a si próprios, mas também às campanhas de outros políticos. Como eles informam o seu patrimônio e como doam dinheiro a campanhas eleitorais, é natural perguntar como um número se relaciona com o outro.O que se observa é que 11% doaram mais do que declararam possuir, o que significa que – nunca é demais repetir – com total certeza mentiram para a Justiça Eleitoral.
É o que este estudo revela, a partir da análise das relações patrimônio/doações para os 2.368 políticos em exercício nas principais Casas legislativas brasileiras. Uma interface interativa, em que se podem realizar diferentes filtragens dos dados, encontra-se em www.excelencias.org.br/@dpat08.php. Nessa interface, para cada parlamentar informam-se também os beneficiários das doações.

Tomando os 782 parlamentares em exercício nas Casas em questão que concorreram nas eleições de 2008 e que realizaram doações e calculando as médias por estados das relações doações/bens, o Maranhão lidera a lista, com uma média de 80,2%.

Mais de 100%

Quase 11% dos parlamentares que foram candidatos e fizeram doações aplicaram nas eleições mais recursos do que informaram em suas declarações de bens. Parte deles declarou patrimônio nulo, negativo ou desprezível (menos de R$ 1.000). Considerando-se inicialmente apenas aqueles que de fato declararam possuir algum bem (18 no total), são os seguintes os parlamentares que doaram mais de 100% de seu patrimônio.

Nada menos de 67 parlamentares afirmaram não possuir bens (ou declararam valores irrisórios, como R$ 1), mas ainda assim fizeram doações. Os seguintes políticos sem-patrimônio doaram mais de R$ 20 mil em 2008: Rosane Ferreira(PV); Vanderlei Cabeludo (PMDB); Marta Costa (DEM); Mariana Carvalho(PSDB); Edmar de Oliveira(PHS); Amaury (PT); Erivelton Lima Santana(PSC); Bruno Miranda (PDT); Santana (PMDB).

Entre 50% e 100%

Vinte e nove parlamentares fizeram doações situadas entre 50% e 100% de seu patrimônio declarado. Ou seja, afirmaram que gastaram mais de metade de todos os seus bens para financiar campanhas, deles próprios ou de outros. Para 9 desses políticos, a parcela dos bens empenhados em campanhas eleitorais superou os 70% do patrimônio que informaram à Justiça Eleitoral.

Doadores não-candidatos

Não apenas políticos que foram candidatos em 2008 fizeram doações eleitorais. Dos 1.531 parlamentares em exercício que fizeram doações, 749 (quase metade) não foram candidatos, tendo financiado outros políticos.

por Claudio Weber Abramo
da Transparência Brasil

ECOS DA "DITABRANDA"

No debate contemporâneo sobre a relação entre história e memória, argumenta-se com propriedade que a história não só é construída pela ação de seres humanos em situações específicas, como também por aqueles que escrevem sobre essas ações e dão significado a elas. Sabemos bem disso no Brasil.

Ao se aproximar os 45 anos do 1º de abril de 1964 e diante de tentativas recentes de revisar a história da ditadura e reconstruir o seu significado através, inclusive, da criação de um vocabulário novo, é necessário relembrar o papel – para alguns, decisivo – que a grande mídia desempenhou na preparação e sustentação do golpe militar.

Referência clássica

A participação ativa dos grandes grupos de mídia na derrubada do presidente João Goulart é fato histórico fartamente documentado. Creio que a referência clássica continua sendo a tese de doutorado de René A. Dreifuss (infelizmente, já falecido), defendida no Institute of Latin American Studies da University of Glasgow, na Escócia, em 1980 e publicada pela Editora Vozes sob o título 1964: A Conquista do Estado (7ª edição, 2008).

Através das centenas de páginas do livro de Dreifuss o leitor interessado poderá conhecer quem foram os conspiradores e reconstruir detalhadamente suas atividades, articuladas e coordenadas por duas instituições, fartamente financiadas por interesses empresariais nacionais e estrangeiros ("o bloco multinacional e associado"): o IBAD, Instituto Brasileiro de Ação Democrática e o IPES, Instituto de Pesquisa e Estudos Sociais.

No que se refere especificamente ao papel dos grupos de mídia, sobressai a ação do GOP, Grupo de Opinião Pública, ligado ao IPES e constituído por importantes jornalistas e publicitários. O capítulo VI, sobre "a campanha ideológica", traz ampla lista de livros, folhetos e panfletos publicados pelo IPES e uma relação de jornalistas e colunistas a serviço do golpe em diferentes jornais de todo o país. Além disso, Dreyfuss afirma (pág. 233):

O IPES conseguiu estabelecer um sincronizado assalto à opinião pública. Através de seu relacionamento especial com os mais importantes jornais, rádios e televisões nacionais, como: os Diários Associados, a Folha de S.Paulo, o Estado de S.Paulo (...) que também possuía a prestigiosa Rádio Eldorado de São Paulo. Entre os demais participantes da campanha incluíam-se (...) a TV Record e a TV Paulista (...), o Correio do Povo (RS), O Globo, das Organizações Globo (...) que também detinha o controle da influente Rádio Globo de alcance nacional. (...) Outros jornais do país se puseram a serviço do IPES. (...) A Tribuna da Imprensa (Rio), as Notícias Populares (SP).

Vale lembrar às gerações mais novas que o poder relativo dos Diários Associados no início dos anos 1960 era certamente muito maior do que o das Organizações Globo neste início de século 21. O principal biógrafo de Assis Chateaubriand afirma que ele foi "infinitamente mais forte do que Roberto Marinho" e "construiu o maior império de comunicação que este continente já viu".

A visão do USIA

Há outro estudo, menos conhecido, que merece ser mencionado. Trata-se de pesquisa realizada por Jonathan Lane, Ph.D. em Comunicação por Stanford, ex-funcionário da USIA, United States Information Agency no Brasil, publicado originalmente no Journalism Quarterly (hoje Journalism & Mass Communication Quarterly), em 1967, e depois no Boletim nº 11 do Departamento de Jornalismo da Bloch Editores, em 1968 (à época, editado por Muniz Sodré), sob o título "Função dos meios de comunicação de massas na crise brasileira de 1964".

Lane enfatiza a liberdade de imprensa existente no país e a pressão exercida pelo governo sobre os meios de comunicação utilizando os recursos a seu dispor (empréstimos, licenças para importação de equipamentos, publicidade, concessões de radiodifusão e "recursos de partidos comunistas"). A grande mídia, no entanto, resiste, até porque "o governo não é a única fonte de subsídio com que contam os jornais. Existem outras, interesses conservadores, econômicos e políticos que controlam bancos ou dispõem de outros capitais para influenciar os jornais" (pág. 7).

O autor, curiosamente, não menciona o IBAD ou o IPES e conclui que as ações do governo João Goulart e da "esquerda" retratadas nos meios de comunicação provocaram um "desgaste da antiga ordem baseada na hierarquia e na disciplina" que se tornou "psicologicamente insuportável" para os chefes militares e para a elite política, levando, então, ao golpe.
O artigo de Lane, no entanto, traz um importante conjunto de informações para se identificar a atuação da grande mídia. Tomando como exemplo a cidade do Rio de Janeiro – "o centro de comunicações mais importante" –, afirma:

"Apesar das armas à disposição do governo, Goulart passou um mau bocado com a maior parte da imprensa. A maioria dos proprietários e diretores dos jornais mais importantes são homens (e mulheres) de linhagem e posição social, que freqüentam os altos círculos sociais de uma sociedade razoavelmente estratificada. Suas idéias são classicamente liberais e não marxistas, e seus interesses conservadores e não revolucionários" (pág. 7).

No que se refere aos jornais, Lane chama atenção para a existência dos "revolucionários", de circulação reduzida, como Novos Rumos, Semanário e Classe Operária (comunistas) e Panfleto (brizolista). O mais importante jornal de "propaganda esquerdista" era Última Hora, "porta-voz do nacionalismo-esquerdista desde o tempo de Vargas".

Já "no centro, algumas apoiando Jango, outras censurando-o, estavam os influentes Diário de Notícias e Correio da Manhã". E continua:

"Enfileirados contra (Jango) razoavelmente e com razoável (sic) constância, encontravam-se O Jornal, principal órgão da grande rede de publicações dos Diários Associados; O Globo, jornal de maior circulação da cidade; e o Jornal do Brasil, jornal influente que se manteve neutro por algum tempo, porém opondo forte resistência a Goulart mais para o fim. A Tribuna da Imprensa, ligada ao principal inimigo político de Goulart, o governador Carlos Lacerda, da Guanabara (na verdade, a cidade do Rio de Janeiro), igualmente se opunha ferrenhamente a Goulart" (págs. 7-8).

Quanto ao rádio e à televisão, Lane explica:

"Cerca de metade das estações de televisão do país são de propriedade da cadeia dos Diários Associados, que também possui muitas emissoras radiofônicas e jornais em várias cidades. (...) Os meios de comunicação dos Diários Associados, inclusive rádio e tevê, empenharam-se numa campanha coordenada contra a agitação esquerdista, embora não contra Goulart pessoalmente, nos últimos meses que antecederam ao golpe" (pág. 8).

Participação ativa

A pequena descrição aqui esboçada de dois estudos que partem de perspectivas teóricas e analíticas radicalmente distintas não deixa qualquer dúvida sobre o ativo envolvimento da grande mídia na conspiração golpista de 1964.

A relação posterior com o regime militar, sobretudo a partir da vigência da censura prévia iniciada com o AI-5, ao final de 1968, é outra história. Recomendo os estudos de Beatriz Kushnir, Cães de Guarda – Jornalistas e censores do AI-5 à Constituição de 1988 (Boitempo, 2004) e de Bernardo Kucinski, Jornalistas e Revolucionários – nos tempos da imprensa alternativa (EDUSP, 2ª. edição 2003).

As Organizações Globo merecem, certamente, um capítulo especial. Elio Gaspari refere-se ao "mais poderoso conglomerado de comunicações do país" como "aliado e defensor do regime" (Ditadura Escancarada, Companhia das Letras, 2004; pág. 452).

Em defesa da democracia

Não são poucos os atores envolvidos no golpe de 1964 – ou seus herdeiros – que continuam vivos e ativos. A grande mídia brasileira, apesar de muitas e importantes mudanças, continua basicamente controlada pelos mesmos grupos familiares, políticos e empresariais.

O mundo mudou, o país mudou. Algumas instituições, no entanto, continuam presas ao seu passado. Não nos deve surpreender, portanto, que eventualmente transpareçam suas verdadeiras posições e compromissos, expressos em editoriais, notas ou, pior do que isso, disfarçados na cobertura jornalística cotidiana.

Tudo, é claro, sempre feito "em nome e em defesa da democracia".

Por todas essas razões, lembrar e discutir o papel da grande mídia na preparação e sustentação do golpe de 1964 é um dever de todos nós.

Do site Observatório da Imprensa
Por Venício A. de Lima em 17/3/2009
Reproduzido da
Agência Carta Maior, 13/3/2009

A luta pelo direto à informação e pela liberdade de expressão ganhou mais um importante aliado, o Marco do Acesso.

Um instrumento de busca das normas sobre liberdade de expressão e acesso à informação foi desenvolvido pela organização Artigo 19, braço latinoamericano da Article XIX, em colaboração com o Intervozes e com a SOMOS, e está disponível no site do projeto Marco do Acesso.

A Artigo 19 luta pela promoção e defesa da liberdade de expressão e do direito de acesso à informação, daí o nome, que vem do artigo XIX da Declaração Universal dos Direitos Humanos que afirma: “todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e idéias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras.”

Num país como o Brasil, aonde a liberdade de expressão e, principalmente, o direito de acesso à informação continuam sendo meras declarações solenes, distantes da realidade, a defesa destes é essencial.

Ainda discute-se, por aqui, a abertura ampla de arquivos públicos sobre os períodos das ditaduras, não só a militar, o que é um absurdo, visto que esconder história não disfarça problema social algum, tampouco garante a paz entre as diversas forças reais de poder, então, a conversa fiada da segurança nacional não cola.

Por aqui, ainda são constantes as censuras togadas, promovidas pelo Judiciário, que assume a triste função dos censores dos regimes totalitários dos regimes de exceção, impedindo, frequentemente, a “livre expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”.

Para o Brasil deixar de ser o "país da grande véspera", devemos batalhar pela constitucionalização da nossa cultura, para, talvez, garantirmos às futuras gerações a possiblidade de viverem em uma sociedade com as condições mínimas para as resoluções pacíficas dos conflitos, o que pressupõe um local aonde os direitos e garantias fundamentais são efetivamente assegurados.
Acesso à Informação Pública